A Presença da MCA nas exequias fúnebres do Dr. Jorge de Mello ( Sócio Honorário nº.1 da Memória Colorida Associação - Os Amigos da Colónia de Férias da CUF)
Dia 11 de Novembro de 2013, foi inumado o Dr. Jorge Mello, falecido aos 92 anos no Hospital da CUF, vitima de doença prolongada.
Tal figura tem para nós, membros da MCA uma importância vital e
um lugar especial no nosso coração sendo Ele um dos obreiros da Colónia de Férias da CUF, local do qual gostava muito e onde se deslocava regularmente no período de Verão, para ver como estava o seu funcionamento.
Assim
e como não poderia deixar de ser, a Memória Colorida Associação
fez-se representar na Basílica da Estrela para prestar as últimas
homenagens a esta individualidade, onde depositaram uma coroa de
flores com as cores da colónia.
Acompanharam, também o funeral até
ao cemitério de S. Marçal no Lourel, Sintra, onde descansa em paz,
no jazigo de família.
Deixamos
a homenagem biográfica do Ricardo Ferreira ao Dr. Jorge de Mello, que poderão
ler em http://industriacuf.blogspot.pt/2013/11/in-memoriam-jorge-de-mello-1921-2013.html:
-------------------------------------------------------------------------------------------------------
Esta semana fica
marcada pelo desaparecimento daquele que para muitos foi considerado
o último industrial português (quando me refiro ao termo
"industrial" é de facto na acepção pura e dura de
criação de indústria seja ela pesada ou ligeira). Por isso venho
até vós para prestar o meu último tributo a esta personalidade
para a qual sempre olhei com grande admiração. Se uns têm por
ídolos jogadores de futebol, cantores, actores, há também aqueles
que olham para os homens industriais e empresários, cujas suas
visões empresariais contribuíram para o progresso do país nas mais
diversas áreas e é esse o meu caso.

No seu livro de
memórias Jorge de Mello refere que:
"nunca senti
nenhum privilégio especial, nem os meus pais alguma vez alimentaram
essa ideia, quer comigo, quer com as minhas irmãs e o meu irmão. Ia
para a escola a pé. Quando chovia, lembrava-me que havia automóveis
na garagem, que estavam parados mas nunca tive a ousadia de falar
nisso à minha mãe. É verdade que tinha gabardina e os meus colegas
de escola, que apanhavam a mesma chuva, talvez não tivessem sapatos
com solas tao grossas como os meus. Mas essa diferença não era
sentida por mim, não era importante não me sentia diferente deles."
Efectuou depois os
estudos superiores (muito a contra gosto) no Instituto Superior
Técnico (ali se manteve ate ao 2º ano do Curso, tendo interrompido
o mesmo para cumprir o serviço militar entre 1942 e 1945) onde Jorge
se deveria formar em Engenharia Química, como era vontade expressa
do seu avô. Porém Jorge sempre manifestou grande interesse pelo
universo da gestão económica, assim e após a morte do seu avô
decide inscrever-se no ISCEF, passando a ter uma vida bastante
preenchida. Nestes primeiros anos, os estudos e as responsabilidades
que lhe são atribuídas na CUF ocupam-lhe muito do seu tempo.

Se a década de 60
foi a época de ouro da economia nacional com crescimentos superiores
aos da média europeia a procura de uma rápida
aceleração/transformação do tecido produtivo e das actividades
económicas, não o foi menos para a CUF. A empresa abre
novos
horizontes, exporta para países que até então nenhuma empresa
portuguesa sonhara fazê-lo: Japão, Austrália, Egipto, Alemanha,
Estados Unidos, Europa do Norte, Bulgária etc., comprovando a
qualidade dos seus produtos, bem como a capacidade concorrencial da
empresa. Abarca novas áreas de negócio como a Hotelaria/Turismo,
Alimentar, Estudos de Mercado, Bioquímica etc. Manuel de Mello era
já um homem muito doente, e quem geria verdadeiramente o Grupo
empresarial era Jorge e o seu irmão, José, a quem coube o mérito
da criação dos Estaleiros da Lisnave, o primeiro empreendimento
português vocacionado a 100% para o Estrangeiro.
Em 1963, Jorge de
Mello é um dos mentores da C.I.E. - Comissão Interna da Empresa,
que pretendia ser um elo de ligação entre os trabalhadores e a
administração. Reunindo uma vez por mês na sede da CUF (Av.
Infante Santo) membros da administração e representantes dos vários
sectores industriais da empresa debatiam desde, assunto relativos às
fabricas, segurança no trabalho, escola da CUF, colónia de férias,
dispensa operaria, etc. Segundo se diz à época o próprio governo
do Estado Novo ficou alarmado com tal coisa, achando que poderia
trazer grandes malefícios para a empresa e para o trabalho nacional,
mas tal não aconteceu. O empresário limitou-se a aplicar um modelo
já existente em países mais desenvolvidos, onde as relações
inter-laborais eram vistas com outra preocupação social.

O 25 de Abril de
1974 e as mudanças radicais ocorridas a nível político e económico
nacional ditam no ano seguinte a nacionalização do Grupo CUF. Para
se perceber a sua dimensão e importância no tecido económico
nacional, refira-se apenas que nele trabalhavam mais de 110 mil
pessoas, em mais de 150 empresas diferentes, que produziam mais de
1000 produtos diferentes, sendo responsável por 5% de toda a nossa
economia. Meses depois do 25 de Abril, o seu irmão José Manuel de
Mello, encontra-se com Álvaro Cunhal na sede do partido, numa
tentativa de chamar a atenção para o facto de que a destruição
não levava a nada. Cunhal ouviu e concordou em parte. Segundo José
de Mello "na altura as pessoas ouviam mas não acontecia nada".
Juntamente com o seu irmão, Ricardo Espírito Santo, António
Champalimaud, Jorge de Brito, Mário Vinhas e outros empresários
criaram a MDE/S (Movimento Dinamizador Empresa/Sociedade) numa
tentativa de lançar as bases de uma moderna economia liberal de tipo
ocidental. Mas os tempos não estavam para essas coisas.
Após o 11 de Março
de 1975 as condições políticas e sociais do país agudizavam-se e
Jorge de Mello bem como os restantes empresários não ficaram imunes
aos novos ventos que se fizeram sentir. Assim a 12 de Março de 1975,
o COPCON, pelas 18 horas na sede da CUF, leva o empresário para
Caxias onde ficaria detido durante uma semana. E só lá esteve esse
curto período graças à pressão exercida por várias
personalidades nacionais e estrangeiras, de onde sobressai a figura
do Presidente da República Francesa Valérie Giscard d´Estang.
Em pleno PREC, o
dia a dia nas empresas era feito pelas comissões de trabalhadores,
que controlavam tudo e todos, efectuando longos plenários onde tudo
era discutido e debatido. Perante tal cenário, Jorge de Mello sabia
que naquele momento permanecer no país era perda de tempo. Preferiu
não assistir ao golpe final desflorado em Setembro através do
Decreto-Lei 457/75 na qual o governo nacionaliza por fim a CUF.
Partirá para a Suíça, onde ali permanece durante três anos,
seguindo depois para o Brasil para um exílio, que só acabará em
1980 ano que regressará definitivamente a Portugal. Ficou também
decidido pelos irmãos que dali para a frente, os negócios seriam
repartidos. Numa entrevista o empresário explicou:
"Tem sido
muito explorado o facto de sermos dois irmãos e de cada um ter o seu
pequeno grupo. É que a nós foi-nos tirado tudo. Cada um de nós, o
meu irmão, eu e as minhas irmãs recebemos como indemnizações
aquelas títulos da divida pública, a 2,5% por 28 anos. Aquilo não
dava para fazer muito: por isso, combinei com o meu irmão que cada
um ia recomeçar tratando da sua vocação."
Assim em 1980 Jorge
de Mello, decide reinvestir em Portugal, para tal arranja um
escritório onde contava com uma equipa de 10 pessoas. Em 1982
adquire ao IPE - Instituto de Participações do Estado (organismo
criado para gerir as empresas intervencionadas pelo Estado aquando
das nacionalizações de 1975) a Alco, empresa de transformação de
sementes oleaginosas. Para tal teve de vender grande parte do seu
património: Quinta de Ribafria, a Herdade do Peral, A Casa do Monte
Estoril (que era do seu avó Alfredo da Silva) etc.

Nos últimos anos
de vida, o empresário levava uma vida calma, dividida entre os jogos
de ténis, cartas, e algumas batidas de caça. Porém em 2005 Jorge
de Mello sofreu uma queda na sua casa do Estoril enquanto brincava
com os seus labradores. Partiu o colo do fémur e teve de se sujeitar
a um período de fisioterapia. Infelizmente, no fim desse período de
recuperação, sofreu um AVC e entrou em coma. Só recuperou a
consciência meses mais tarde, ficando incapacitado de andar e de
falar.
Aos 92 anos partiu
para sempre deste mundo deixando o seu legado. Fechou-se para sempre
o derradeiro ciclo da história da CUF. A sua última morada é o
Cemitério de S. Marçal onde foi inumado no jazigo de família.
Para rematar esta
minha sentida homenagem, deixo aqui um pensamento que se encontra no
seu livro de memórias e eu considero que apenas alguém com
inteligência superior e dotada de um grande sentido de visão
poderia escrever isto:
"E quanto à
riqueza, conheci muitas pessoas em Portugal, de quem nunca se falou,
que eram e são muito mais ricas do que eu. E é claro que bastava
passar a fronteira para encontrar pessoas muito mais ricas e
poderosas do que eu alguma vez poderia ser em Portugal. A ideia de
riqueza é muito mais um produto da imaginação dos que não se
sentem ricos. Um dia alguém me falou do homem mais rico de Portugal,
ao que respondi que também já tinha sido disso, com a ironia de
quem me conhece a relatividade desses atributos e desses títulos."
Até sempre meu
ídolo!!!
Por: Ricardo
Ferreira (Presidente da Assembleia Geral Memória Colorida
Associação)